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Os casos concretos de deflação na história das economias são tão poucos e diferentes que, nas universidades, a deflação é tratada apenas como um conceito teórico hipotético dada a forte improbabilidade de ocorrência. No final do século XIX, na Europa, a deflação coexistiu com um forte crescimento do PIB devido à inovação dos transportes e energia. No entanto, nos EUA, após a crise de 1929, existiu um período de deflação até 1933, acompanhado de uma quebra no valor dos salários e um alto nível de desemprego. Mais recentemente, no Japão, durante a década de noventa, a deflação obrigou a taxas de juro de 0%. Esta semana, responsáveis europeus pela política monetária falaram em taxas potencialmente negativas e no risco de deflação. Por deflação entende-se a diminuição continuada e persistente do Índice dos Preços no Consumidor.

Apesar do benefício imediato para o poder de compra, a deflação conduz, a prazo, a um período de estagnação e sobretudo aumenta de importância relativa, o valor das dívidas, num Portugal endividado, pública e particularmente, beneficiando apenas quem tem poupanças a taxas fixas. Os consumidores têm larga experiência a lidar com aumentos de preços, mas uma fraca tradição a reagir a fenómenos de deflação. A taxa de inflação é calculada tendo por base um cabaz de cerca de centena e meia de produtos devidamente identificado pelo INE. Nem todos esses produtos apresentam descidas de preço, nem muitos dos produtos e serviços entram sequer nos cálculos desse cabaz.

Seria necessário estas expectativas afectarem todos os agentes económicos, o que está ainda longe de acontecer, para se assumir uma conjuntura de deflação. A sobrevalorização e inflação continuada de activos financeiros e de títulos de crédito, sem cobertura real está na origem de um impacto deflacionário (desvalorização) deste capital monetário fictício, num ajuste real de valor ao mercado. Além disso, as autoridades económicas nunca se preocuparam com o overchoice na produção e comercialização – excesso de oferta face à dimensão da procura, desvalorizando igualmente os activos reais. No pós-recessão, o ciclo económico não tem que passar necessariamente por uma depressão económica com decréscimos reais do PIB consecutivos. Aliás, apesar da conjuntura pouco animadora, o aumento do desemprego fez baixar a taxa de inflação – é o fenómeno da Curva Phillips que representa uma relação inversa entre a taxa de desemprego e a taxa de crescimento dos salários nominais.

Também o crescimento real da economia nacional permanece negativo (-2,1%, no segundo semestre 2013) e a taxa de inflação regista no segundo semestre de 2013, o valor de 0,8% coexistindo com uma taxa de desemprego de 16,4%. Desde então, o Consumo Privado e a FBCF têm vindo a decrescer e os índices de confiança indústria, no comércio e na construção têm acompanhado esta tendência. No entanto, apesar de negativos, estes indicadores abrandaram o ritmo de quebra relativamente ao primeiro semestre de 2013. Estamos a assistir parcialmente à desalavancagem dos agentes, que consiste na venda de activos e na tentativa de amortização de créditos, mas sem liquidez suficiente. A queda dos índices das bolsas deve-se a esta incerteza e instabilidade dos mercados. Se a venda de activos se generalizasse poderia contribuir para um cenário condutor a uma situação depressiva com uma combinação entre estagnação económica e deflação continuada. Se as autoridades monetárias avançam directamente para a injecção directa de dinheiro no sistema, à semelhança da política expansionista dos EUA, podemos deparar com um cenário de inflação galopante a prazo, uma vez que no imediato não está a produzir quaisquer efeitos mesmo com taxas de juro baixas.

Os bancos criam reservas mas o risco de empréstimo ao ser elevado, a massa monetária não circula (armadilha da liquidez). Em suma, a economia enfrenta dois cenários que não se excluem mutuamente: no curto prazo, uma estagnação dos preços com níveis de desemprego tendencialmente crescentes e até de estagflação com crescimentos económicos reais nulos e negativos. No entanto, esta é uma das condições necessárias à retoma económica. O grande risco, a médio prazo, aquando da estabilidade económica será a intensa circulação e desvalorização do dinheiro com índices elevados de inflação, se mais uma vez os bancos centrais falharem na sua missão essencial, como têm falhado as autoridades orçamentais nacionais (à falta de um único orçamento europeu centralizado e uniformizado, que tanta falta faz) – a supervisão e regulação da economia.

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