Select Page

Aquilo que inicialmente é uma boa ideia e um bom princípio, rapidamente se pode transformar numa aberração. As Finanças vão iniciar este mês o sorteio semanal dos veículos Audi A4 e semestralmente do Audi A6 em função das facturas com NIF. 

A avaliar pelos indicadores, o número de facturas emitidas subiu consideravelmente nos últimos meses, não só pelo incentivo do sorteio, mas também pelo facto de, em determinados sectores, o contribuinte poder deduzir em sede de IRS, desde o ano passado, 15% do montante do IVA suportado.

Tive já ocasião de me manifestar favoravelmente, como qualquer cidadão, contra a fraude e evasão fiscal. Nesse sentido, todos temos a ganhar enquanto país. Apesar de não entender a lógica de apenas as reparações automóveis, de motociclos, de cabeleireiros ou restauração e hotelaria, serem exclusivamente os sectores que atribuem benefício de dedução em sede de IRS. Parece-me um problema de iniquidade, pois deixa de fora a “obrigatoriedade” de registo de vendas e a consequente falta de emissão de facturas a sectores como as mercearias, as floristas, ou todos os sectores de comércio. Não entendo porquê. Assim como os sectores que actualmente têm benefício em sede de dedução eram responsáveis por grande parte da economia paralela sem registo de operações, também é certo que outros sectores irão continuar a fugir a registo de operações.

Quanto ao sorteio, pode ser um bom incentivo para o contribuinte/consumidor pedir sempre facturas, pois os “cupões” para o concurso engloba todas as facturas com NIF independentemente do sector de actividade. A ideia parece-me eficiente e este modelo já resultou muito bem noutros países, tendo combatido a evasão fiscal, aumentando a receita do Estado tornando a fiscalidade efectivamente mais democrática e controlada.

O que me espanta em Portugal é a “filosofia” do sorteio. Fiquei incrédulo quando soube que o “prémio semanal” seria o anunciado automóvel Audi. Tratam-se viaturas com um PVP superior a 35.000 euros, no caso do Audi A4, ou superior a 47.000 euros, no caso do Audi A6. Mesmo pressupondo que o preço foi muito mais vantajoso para o Estado, pois a aquisição dos prémios resultou de um procedimento de contratação pública de aquisição de bens, efectuado pela Entidade de Serviços Partilhados da Administração Pública, I.P. através de acordo quadro em que foram apresentadas diversas propostas, não é menos verdade que o custo de manutenção destas viaturas é muito superior ao nível médio de vida do cidadão português, pois pode muito bem atingir valores mensais perto do ordenado mínimo nacional ou superior só em combustíveis, impostos e manutenção/revisões. Acima de tudo o que se revela chocante é a profunda irracionalidade económica que tem por base a atribuição de um Audi A4 ou A6, nomeadamente porque se trata de um incentivo à importação (carros alemães), mas sobretudo porque se o prémio fosse em dinheiro ou em crédito, era capital que ficava em Portugal, e em que o contribuinte contemplado poderia aplicar em poupança, consumo ou investimento, contribuindo assim para o crescimento económico, para o emprego e para o efeito multiplicar da própria fiscalidade através da aplicação do prémio, gerando ainda mais receita para o Estado. Estaríamos a falar de mais de uma centena de milhares de euros mensais, aplicáveis e injectados na economia nacional e não, aberrantemente, na importação.

O Governo é o pior inimigo de si próprio. Sortei-se!

ver mais…

Miguel Varela
Diretor ISG | Business & Economics School

×

Bem-vindo(a)!

Contacte-nos pelo WhatsApp

× 969844241