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O patriarcado em tempos de guerra!

11 de Dezembro, 2017

Chega a época natalícia e, por pressão do período em causa, surge-nos repentinamente a vontade de sermos solidários por pensarmos que nesta altura, todos devem dispor das mínimas condições de qualidade de vida. Algo que infelizmente, muitas vezes não nos lembramos durante o ano, já que andamos assoberbados com o trabalho e a vida, esquecendo-nos muitas vezes até da nossa própria família.

Tal acontece porque, ou a consciência nos pesa, ou porque realmente pretendemos moral e religiosamente, aperfeiçoar-nos a nível interior. É assim, um dever que nos vai fazer sentir melhor perante o nosso Criador, os semelhantes e nós próprios. Há pois que oferecer as roupas que não usamos, comprar um pacote de leite para doar ou adquirir um pirilampo para tornar uma criança mais feliz e tudo claro, no campo das boas intenções, visto que, se porventura o coração não o quiser, não existe modo de nos compelir a cumprir com os intentos prosseguidos pela sociedade ou Igreja.

Os comportamentos descritos devem ser um dever de cada Ser Humano, enquadrados nas Ordens Normativas Moral e Religião, mas não são (nem devem ser) um direito de terceiros por faltar o elemento coercibilidade, podendo o individuo mais insensível ser penalizado apenas com a reprovação social ou religiosa, algo que possivelmente nem o preocupará muito, ficando dependente da sua consciência, do seu livre arbítrio e da necessidade em tentar alcançar a sua perfeição.

No entanto, a sociedade necessita obrigatoriamente de padrões de conduta que permitam não só a convivência social dos vários membros que a compõem, como igualmente a resolução de conflitos que derivem dai, já que não é colectivamente possível ficar ao nosso livre arbítrio decidir quando respeitamos ou não, aqueles que connosco se cruzam.

É por isso que existe a ordem normativa jurídica, vulgo direito, que permite as totais liberdades espiritual e moral, aplicáveis deste modo a entes integralmente livres, não tencionando coordenar os escrúpulos de cada um já que tal opção deve ser entregue ao próprio, mas sim os direitos e deveres perante o outro.

Pretendendo apenas possibilitar que os cidadãos vejam a sua natural dignidade salvaguardada, sem atropelos de terceiros, visto que a correspondente liberdade termina quando se inicia a do seu semelhante. Ambiciona aliás, facultar que todo o ser humano sem excepção, opte por aquilo que deseja, que o possa tornar feliz, como está inclusivamente estatuído na Declaração Universal dos Direitos do Homem. Mas também, por outro lado, responsabilizando-o e limitando-o perante o seu similar e filho do mesmo Deus, que usufrui da mesma honorabilidade.

Nestes termos e ao contrário dos restantes sistemas sociais, as normas jurídicas são efectivamente obrigatórias e vinculativas (nos outros só são obrigatórias) para protecção de direitos alheios e por isso com cariz coercivo, possuindo mecanismos que coarctam verdadeiramente as atitudes adoptadas que sejam violadoras das imposições preceituadas, caso até, nas condutas mais gravosas, da perda da inerente liberdade inicialmente entregue pelo próprio Direito.

Sendo e devendo ser indiferente para um real sistema jurídico democrático outras finalidades e, nomeadamente, a possivel perfeição do próprio homem, já que a mesma deve ser procurada por este e não pelo direito, que se deve “apenas” preocupar com a vivência social e o bem comum na sua comunidade.

Estes são pois os fundamentos do seu aparecimento e vinculatividade, sendo inconciliável e uma mera ilusão, a sobrevivência do homem sem ser em sociedade (ubi homo, íbis societas) e a manutenção desta sem regras de comportamento compulsivas e de carácter coactivo (ubi societas, ibi jus).

Deste modo, o sistema jurídico estatui prioritariamente, através das suas normas, condutas que possibilitem o normal convívio na sociedade entre os seus ocupantes, com respeito mútuo de direitos (e portanto, também de deveres) e subsidiariamente, de imediato, em caso de violação das disposições determinadas, um núcleo de instrumentos que resolvam os conflitos suscitados.

Sendo que, só a adequada correlação entre estes dois fundamentos, permitirá a existência de um factual Estado de Direito.

Professor Miguel Furtado, Docente do ISG

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